Duda
Texto: Thiago André Monteiro
Narração: Chico Gabriel e Malu Gabriel
Edição: Chico Gabriel
Um dia ela surgiu com sua carinha meiga que mal passava minha janela.
— Compra flores, tio? — Tinha uns nove anos, cabelo preto escorrido, roupa surrada. Devolvi o sorriso e comprei as lindas rosas vermelhas.
No dia seguinte, o mesmo sorriso e as mesmas rosas vermelhas.
— Compra flores, tio?
— Qual o seu nome, menina?
— Duda.
Comprei as flores e contei à minha esposa sobre a garotinha.
Todo dia ela surgia, sempre vendendo suas rosas vermelhas, e eu, nesses trinta segundos diários, descobria um pouquinho mais sobre ela. Era órfã, morava embaixo de um viaduto e seu irmão tinha sido morto há mais de um ano. Um dia, não aguentei mais e disse à minha esposa:
— Querida, quero adotar a Duda.
Minha esposa aceitou de cara. Seu coração se destroçava em silêncio junto com o meu.
No dia seguinte, parei o carro trêmulo.
— Compra flores, tio?
— Duda, você quer ser a minha filha e morar lá em casa?
— Sério? — perguntou meio ressabiada.
Nossos olhares entraram num acordo.
— Tio, deixa só eu pegar minhas flores ali no canteiro central.
Ela pegou as flores e voltou correndo, dançando, flutuando… mas não viu a moto vindo entre os carros.
Hoje, estamos eu e minha esposa jogando rosas vermelhas num caixãozinho branco.
Thiago André Monteiro
julho, 2019